sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Pe Manuel Augusto - Meias verdades 3

As vocações são dom de Deus
O futuro do nosso carisma missionário comboniano e das novas formas de o vivermos no seio das igrejas locais depende das vocações que tivermos, de novas forças e recursos humanos que no futuro integrarão o nosso instituto e os demais institutos da família comboniana. O facto de na Europa, por exemplo, não dispormos de novas vocações e estarmos a ficar com idades avançadas, condiciona o processo de discernimento de que falávamos acima, acabando por nos levar a fazer as "opções carismáticas possíveis", dada a idade e a índole das pessoas.
Em relação com este aspecto (da falta de vocações) a meia verdade que temos vindo a repetir é que "as vocações são dom de Deus". Quer-se com isto dizer que não nos devemos angustiar com a sua falta. Mas a verdade inteira é que as vocações, se por um lado e primeiro são dom de Deus, por outro e logo a seguir, são fruto e expressão da vivência do nosso carisma. Dependem, por isso, da vivência do nosso carisma e dos nossos métodos de trabalho e promoção vocacional, da nossa capacidade de transmitir o carisma a outros, a outra geração.
Certamente não nos devemos angustiar com o nosso futuro. Mas devemos viver o nosso empenho no presente, com a consciência de que tudo também depende da nossa vida e trabalho: fazer as coisas como se dependessem de nós, sabendo que dependem de Deus! Isto é, sem nos dispensarmos de nos questionarmos sobre os métodos mais adequados para viver e transmitir o carisma, para fazer animação e promoção vocacional, para iniciarmos os jovens à vivência do carisma missionário comboniano na formação de base. Não nos devemos angustiar com os resultados, mas tão pouco podemos encolher os ombros, como se de nada se tratasse. As vocações são dom de Deus, mas a responsabilidade de as procurarmos, nutrirmos e fazer crescer é nossa; está é a verdade inteira a este respeito, uma verdade que nos deveria incomodar, fazer pensar logo de manhã! (para usar a expressão de alguém na nossa última assembleia).

Missão é...
Outra meia-verdade do nosso vocabulário corrente é dizer que "missão é..." e enunciar, de um modo exclusivo, uma das dimensões da missão cristã. Note-se que, ao dizer isto, não se pretende negar o enriquecimento da visão missiológica que significou o alargar das dimensões da missão, de modo a incluir, por exemplo, a ecologia e a defesa da criação, a justiça e a paz, a acção de conscientização em favor das causas que são essenciais para os processos de transformação social, cultural, económica e política das sociedades onde vivemos o nosso carisma. O que se pretende dizer é que é necessário afirmar a verdade inteira; isto é, que, por exemplo, "missão é justiça e paz", tanto quanto, e na medida em que esta dimensão da missão cristã está unida às demais e, sobretudo, ligada à dimensão central, que é o testemunho e o anúncio de Cristo. As várias dimensões da missão, separadas ou isoladas em si próprias, como habitualmente aparecem, correm o risco de se transformarem em acção sem ligação à missão cristã, em causas mais ou menos ideológicas ou de moda que acabam por perder a matriz de onde nasceram.
No capítulo de 1997 operámos esta transformação, de linguagem e de visão missionária, afirmando que "missão é.... numa multiplicidade de dimensões que enriquecem o nosso serviço missionário (e que deram o título aos vários documentos desse capítulo: missão é inculturação e dialogo, missão é colaboração, missão é animação missionária, missão é empenho pela justiça e pela paz, missão é atenção à pessoa, missão é serviço de autoridade em comunhão e subsidiariedade, missão é partilha de bens (DC 1997 nº 32-199). Mas temos muito que fazer e andar para viver essas dimensões de modo integrado, para reconduzir todas essas dimensões da missão cristã ao seu centro, de onde lhe advém a vitalidade, e evitar que se isolem numa prática que absolutiza a parte em detrimento do todo e que acaba por reforçar o tradicional individualismo comboniano. Esta situação deixa-nos de costas viradas uns para os outros, cada um absolutizando uma dimensão ou identificando-se com a dimensão do seu gosto e/ou interesse e diminuindo o sentido de missão e projecto comum.

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